A publicação do réu na rede social facebook, verifica-se que ultrapassou os limites do exercício de liberdade de manifestação de pensamento, entendeu o Magistrado. 


O direito de crença e a liberdade de expressão não são absolutos, mas sim limitados por outras garantias fundamentais. Assim, a 33ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo condenou o deputado federal e pastor Marco Feliciano (Republicanos-SP) a pagar indenização de R$ 100 mil por dano moral coletivo, devido a ataques contra a comunidade LGBT+.

 

A ação foi movida pela ONG Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual (Abcd's), que em 2015 participou da Parada Gay de São Paulo com seu trio elétrico. Na ocasião, uma atriz desfilou crucificada como Jesus Cristo, em um ato de protesto contra o aumento de mortes relacionadas à discriminação contra a população LGBT+.

 

Nas redes sociais, Feliciano, membro da bancada protestante do Congresso, disse que as imagens eram chocantes e enumerou diversos outros atos de desrespeito ao catolicismo, que sequer teriam ocorrido na ocasião. 


Mais tarde, em uma sessão plenária da Câmara, ele classificou as cenas como "blasfemas", afirmou que os ativistas teriam cometido "crime de profanação contra o símbolo religioso" e defendeu que a Parada Gay deveria ser proibida. 


Postagem do Deputado a época 07/06/15👇👇👇





Para a autora, o parlamentar teria ofendido a honra da atriz e da ONG e incitado seus seguidores a ridicularizar e ameaçar pessoas da comunidade.

Em sua defesa, o deputado argumentou que estaria protegido pela imunidade parlamentar. Ele alegou que não teve o objetivo de manchar a honra de ninguém, afirmou que o protesto teria conteúdo político e defendeu seu direito à crítica e à manifestação de sua consciência religiosa.

A atriz Viviany Beleboni, de 26 anos, é transexual, espírita e chocou parte dos participantes da 19ª Parada do Orgulho LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) no domingo (07/06/2015). Ela se prendeu à cruz, encenando o sofrimento de Jesus, para “representar a agressão e a dor que a comunidade LGBT tem passado”. "Nunca tive a intenção de atacar a igreja. A ideia era, mesmo, protestar contra a homofobia", explicou Viviany ao G1 na época.

Decisão

O juiz Douglas Iecco Ravacci lembrou que a imunidade parlamentar só é absoluta quando exercida dentro do recinto do Parlamento. Além disso, as declarações do réu teriam sido feitas como pessoa comum, e não por conta do mandato.

De acordo com o magistrado, Feliciano "ultrapassou os limites do exercício de liberdade de manifestação de pensamento, uma vez que não se conteve em exprimir sua posição contrária, ainda que de conteúdo religioso".

O parlamentar teria gerado confusão, já que postou fotos do protesto junto a outras que sequer eram registros da Parada Gay de 2015. 

Para se justificar, o deputado alegou que as críticas eram direcionadas a "todas as paradas que profanam símbolos religiosos", e citou como exemplos a Marcha das Vadias e a Marcha da Maconha. Segundo o juiz, ele associou o protesto da ONG com outras causas.

Entendeu o magistrado que:

No mérito, conforme se infere da publicação do réu na rede social facebook, verifica-se que ultrapassou os limites do exercício de liberdade de manifestação de pensamento, uma vez que não se conteve em exprimir sua posição contrária, ainda que de de conteúdo religioso.

(...)

A conduta ilícita do réu não se baseia na sua liberdade de manifestação e pensamento, mas sim no fato de que, com ela, ao fazer associações com outras manifestações, fora do contexto, reforçando estereótipos, e fomentando a intolerância e discriminação, tudo sob apelo moral e religioso

Apesar de estabelecer a indenização, o magistrado negou um pedido da ONG para que o parlamentar pagasse os custos de produção de um programa de televisão em favor dos direitos da população LGBT+, com a mesma duração dos discursos proferidos. 

O juiz explicou que as ações de Feliciano não foram praticadas em programas televisivos, "e, de todo modo, a indenização já será destinada à promoção de tais direitos".

📷 Joao Castellano/Reuters/Victor Moriyama/G1/Fotomontagens: Geilson Souto

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